Chuparia um cadáver. Refletiu Narciso enquanto fantasiava
com os espectros no ônibus. Nenhum cego mascava chicletes. Nenhum inseto
gigante. Ninguém suficientemente interessante, todos apáticos namorando o cinza
que corria pela janela. Crianças, bundas gordas, olhares tristes. Alguém peida.
O cheiro de azedo se mistura com o podre. Um homem roça seu membro no ombro de
uma adolescente sentada no corredor. Era disso que Narciso precisava. O nadismo.
A apatia. Narciso só pensava “chuparia um cadáver”, “sugaria uma alma como se
nela houvesse a última gota de saliva de São Paulo”.
O ônibus freou bruscamente. Um senhor grisalho e barrigudo
esbravejou um palavrão. Entra um homem. Ele também se chama Narciso. Em tudo se
parece com Narciso, eles se olham. Seus corpos se tocam. Narciso sente o bafo
de Narciso na sua nuca. O hálito quente torna o resto invisível, mãos se
entrelaçam, caralhos se erguem e ninguém vê absolutamente nada. Narcisos se
amam. Narcisos chupariam um cadáver. Narcisos sentem que vem vindo. Narciso
puxa uma navalha e desenha um corte na garganta de Narciso. Narcisos gozam.
Narcisos morrem para depois matar. Narcisos chupariam um cadáver.
Nenhum comentário:
Postar um comentário